domingo, julho 27, 2008

A fost sau n-a fost?




Faltou-me a coragem para o Senhor Lazarescu. Dessem-me uma semanita para respirar, e estaria lá batida, mas assim, ainda sob a influência do Mungiu... bom, a sanidade mental falou mais alto. Fica para outras núpcias. Hoje foi a última etapa romena no Nimas. E mantendo-se o cinza generalizado, a desolação, a pergunta faz-se 16 anos depois da queda de Ceausescu: onde estiveste tu no dia 22 de Dezembro de 1989? Mas mais importante ainda, houve ou não houve revolução às 12:08 A Este de Bucareste? Começamos por receber pinceladas simples e certeiras das vidas daqueles três homens que vamos ver lado a lado a olhar para a câmara. Tudo o resto é um fabuloso programa de televisão, caseiro a armar à CNN, onde um engenheiro têxtil enriquecido crê fazer algo de relevante, fazendo a pergunta relevante — houve ou não houve? a fost sau n-a fost? —, a pessoas relevantes — afinal chegou à praça antes ou depois das 12:08? afinal foram heróis ou apenas foram na carroça? afinal de onde roubou as magnólias que ofereceu à sua mulher nesse dia? —, com telefonemas relevantes — os membros da Securitate não têm passado e o professor estava na praça, sim, mas bêbado. É a revolução uma questão horária? Ou funciona mesmo como os candeeiros de rua, primeiro acendem os do centro, depois o círculo alarga para a periferia? Ou afinal é preciso lembrar que houve vidas perdidas e que hoje neva lá fora, amanhã será lama, não há tempo a perder?

No meio de tantas pequenas perguntas que se riem das respostas, a omnipresente praça de papelão, os jogos das luzes de rua em abertura e fecho, o nível e a carne dos actores, a realização sem artifícios mas não sem arte, até no retratar delicioso do amadorismo televisivo, a hilariante melancolia dos diálogos, o papel que constrói barcos nas mãos de Piscoci e se desfaz em pedaços nas de Manescu. Aliás, o Piscoci de Mircea Andreescu, o tal que em 1989 roubou as magnólias, é uma antológica figura de cinema, que rouba qualquer cena só com o olhar. A sua comédia é tão singela, tão ternamente amarga, o seu texto tão inteligente, as suas cenas hilariantes. Os tempos de todo o filme são de um refinamento a toda a prova, e os questionamentos de uma inocência acordada. Belo. E fez-me rir. Muito. "Cinema romeno" não era expressão muito presente no meu vocabulário artístico, mas ricas surpresas nos chegam da terra do conde Vlad.

Sem comentários: