domingo, maio 25, 2008

penso, ou existo?

Onde ontem vi um espectáculo absolutamente rítmico e sem quebras, o M viu um espectáculo a puxar para o histérico. Hoje alguns de nós tinham uma sensação estranha, de que a energia tinha oscilado muito e com ela o ritmo. Eu, que acho que este café é quase uma italiana que se bebe de um trago, hoje tive a sensação de que nunca mais se chegava ao segundo acto e depois ao terceiro, uff. Sentencia o nosso encenador que não, que foi equilibradíssimo, de tempos justos e pica presente. Muito melhor que o de ontem, claro!

... Claro. É nestas alturas que se torna bem evidente porque é que actores que pensam demais são verdadeiras pains in the ass, mea culpa, mea maxima culpa. E então? A verdade é que, fervilhando em cada corpo, há um nível mínimo que já temos entranhado e abaixo do qual parece já ser impossível descer. Por outro lado, a carreira-relâmpago dá-nos uma sensação muito presente de que é este o tempo que temos e queremos sugá-lo até ao tutano. Talvez pela proximidade da morte, temos um espectáculo que vive pujantemente a cada noite [e a maior parte do elenco, a levar porrada em ensaios vespertinos, anda literalmente de rastos]. E para além de tudo, há uma coisa que privilegiadamente o palco nos saca: a inteligência da intuição, do corpo, do espaço, dos outros, uma inteligência que não pensa, apenas é. Na cena com as minhas sisters, e apesar de ler, desde o início da função, uma certa pasta no ar, soube claramente que o ritmo estava no ponto, picado e vibrante. Não porque o tenha pensado. Senti, só isso. Estava certo. Só isso. E todos os dias me dou graças a mim própria por me ter decidido a enfrentar o teatro. Lições como esta, que tenho aprendido e reaprendido no palco ao longo desta pouco mais de meia-dúzia de anos, não têm preço. Nunca as minhas mãos ficam vazias.

...e amanhã, acaba. Assim, ainda mal começado. Assim, tão pronto para continuar a estrear todas as noites. Mortes. E nascimentos, sucessivamente. Talvez para que não nos esqueçamos de que é a vida que no fim justifica esta coisa a que chamamos profissão.

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