quarta-feira, outubro 15, 2008

a pouca-vergonha

Inesperadamente fiquei sem um trabalho que era certo [certinho como tudo nesta vida] e consequentemente sem ordenado. O primeiro mês foi especialmente complicado, uma vez que no mês anterior tinha andado a trabalhar de graça, e se o Céline já lá vai, lido nos intervalos entre História dos Media e o King, a verdade é que juntando o aumento absurdo da prestação da Habitação, tive de dar asas ao meu diletante alter-ego de cobrador-do-fraque [sim, sou daquelas que se esquece de ir receber até ver a luz da saída de emergência] e mesmo assim fiquei a conhecer a vida a crédito, cada cheque direitinho para pôr a zeros o plafond da conta ordenado. Que é super, como dizem eles. Ando assim desde Julho. O meu banco, o único, o Big Brother que conhece toda a minha realidade financeira, sabe-o tão bem como eu, e a coisa reequilibrou-se aos poucos mas só vai compensar daqui a mais umas semanas que me vão parecer anos. No último mês a minha prestação desceu doze cêntimos, afinal enganei-me nas contas, é má-vontade com certeza. E hoje recebo em casa uma carta muito simpática exortando-me a concretizar sem demora os meus projectos. Um Crédito Pessoal pré-aprovado que posso accionar pelo telefone, pela internet, por telepatia, quiçá. E como se não bastasse, no fim da página vem, simulando um "destaque pelo picotado", um cheque com todo o aspecto de oficial, com onze mil setecentos e cinquenta euros passados ao meu nome. Claro que na margem explicam que o "documento simboliza o crédito que o Banco está disposto a conceder-lhe, não sendo válido como título de pagamento", que eles são gajos decentes e de repente o cliente até se pode esquecer que lá em cima se propunha a maravilhosa prestação de 298,46€ por 60 meses. Gosto do uso do símbolo, revela elevação intelectual, alguém no departamento de marketing estudou o Umberto Eco. Bravo.


Por muito que me desagrade a palavra, só encontro um adjectivo para isto: imoral.

1 comentário:

polegar disse...

pois que por onze mil pagavas quase dezoito mil. bom negócio...

nós por cá, no que toca a créditos, é a prestação do carro por mais 2 anos [e que não existiria se houvessem transportes decentes] e usar o visa comedidamente, contando sempre que será pago não em prestações, mas por inteiro no mês a seguir. por isso o visa resume-se a pagar uma ou outra viagem que não permita multibanco online, e para comprar coisas no Amazon... muuuuito de vez em quando ;))

que é como quem diz, nós por cá é contá-los e tentar não dever nada a ninguém... até que o governo nos encontre...