quinta-feira, agosto 14, 2008

tao

Porque, bem vê, só quando estamos esgotados (de ternura ou de qualquer outra força) reconhecemos a nossa inesgotabilidade. Quanto mais dermos mais nos sobra, desde que prodigalizemos - é uma coisa sempre a brotar! Sangremo-nos - e seremos fonte viva.

Marina Tsvietaieva, Noites Florentinas, Oitava carta



Há coisas que dizemos. Como esta, assim: acho que só agora compreendo na totalidade o alcance destas palavras. Mentira. Já antes o compreendera. Mas o esquecimento é o fim do arco da memória, arco antigo guiado pela vara guiada pela mão direita de um miúdo canhoto. Rasgão de luz, a relação com uma sequência de palavras faz-se sem se ver e adormece e acorda e adormece. E quando acorda dizemos: acho que só agora compreendo na totalidade o alcance destas palavras. E no fundo sabemos que nunca soubemos totalmente o que quisemos dizer com "totalidade".

Acho que agora, talvez. A dádiva regenera-se em si mesma. A dor sangra. O amor guardado apodrece. Sangue e podridão. Duas imagens muito directas no que à vida e à morte diz respeito. Hoje alguém me dizia, eu não quero estar vazio aos 24 anos. A essa recusa brindo, a essa e à recusa de apodrecer antes do tempo certo. Que é aquele em que a casa ficou desabitada e o inquilino se tornou musgo nas paredes, só vapor condensado, nada de sangue. O tempo em que já nada se sente.

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