Diz então Alberto Caeiro, que, segundo os rumores, sempre embirrou solenemente com o Álvaro de Campos [as relações não tendem a ser fáceis entre pessoas que partilham as duas primeiras letras de cada nome]:
Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.
E digo eu, que embirro muito mais com o Alberto Caeiro do que com o Álvaro de Campos, embora, como boa apaixonada, embirre com os dois: fazendo um círculo em redor do indizível, perguntêmo-nos então se as flores e os frutos acaso têm forma, cor e existência, ou se essas palavras são meros nomes que encerram em si a humana tradução possível de uma impressão. Mestre Alberto diz, inequivocamente, que as coisas têm forma, cor, existência. Mas beleza não. Ou seja, cor, forma, existência, são palavras às quais subjaz um valor concreto, material, existem independentemente do observador. Mas beleza não. Será uma palavra cujo valor se esgota em si mesma, ou poderá ser também tradução de algo concreto, embora bem menos óbvio do que um azul, uma esfera ou uma presença física? É o nome de uma sensação, de uma emoção, de uma reacção química, de umas quantas sinapses, o nome de qualquer cousa que não existe, que eu dou às cousas em troca do agrado que me dão? Fico a pensar no que distingue verdadeiramente estes substantivos na forma como se relacionam com os respectivos significantes. Se é que algo de essencial os distingue.
... e o inconveniente engenheiro naval lá continua a picar-me ao ouvido:—Mas então onde está a beleza disto?...
Ou ela só existe na directa proporção da pouca gente que há para dar por ela? Sendo que eu, um boi a olhar para o Taj Mahal, não me incluo no grupo, mas sei que se me explicarem tudo bem explicadinho...
sábado, agosto 09, 2008
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1 comentário:
As coisas nao têm paz... nem beleza. Há coisas que nao sao independentes do observador, por muito universais que possam chegar a ser. Mas nunca há consenso com a beleza, há milhoes que consideram la Guernica ou a Sagrada Família ou a Penélope Cruz ou a fórmula do binómio de Newton belíssimas e outros tantos milhoes que têm a opiniao contrária. A beleza nasce da interacçao de uma pessoa com outra ou com outra coisa, talvez nao exista apenas em nós, mas existe por nós. Se calhar é como aquele dito de que uma mao nao palmas sozinha...
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