sábado, agosto 23, 2008
divergências significantes: a simbiose
Henri Cartier-Bresson, 1908-2004
Ao repescar estes textos, que como já disse têm praticamente cem anos, li na diagonal algumas contextualizações oferecidas a quem lançou o desafio, e regressei àquele sentimento de estranheza que tive há cem anos atrás. A maioria das pessoas vê nesta imagem um casal ligado, apaixonado, com história ou com futuro, vê a simbiose, a troca. Eu nunca vi tal coisa. A sensação de desconforto que esta fotografia sempre me trouxe passa pela intuição do sacudir do comboio nos carris, mas assenta sobretudo naquele gesto de cárcere que envolve o pescoço da mulher. É quase violento, no seu estatismo, no ar que não deixa entre o seu antebraço e a traqueia alheia, parece quase difícil que ela respire, que ela possa decidir mover-se. Não é troca, é uso.
Olho as minhas palavras. E vejo a minha fraqueza, a minha esperança, a minha resistência ao escuro. Sem notar, tive de recorrer a um estratagema simples para expressar a minha incomodidade, e dei-lhes uma relação contingente, efémera, morta antes de existir, chamei-lhes estranhos, desconhecidos, acidentes. Quando o contacto dos corpos sussurra que o não são. Que se conhecem bem. Que se amam, até, talvez. Não consegui embeber tal relação no desconforto com que a imagem me atinge. A negação é o diabo...
Hoje, provavelmente, o texto seria bastante diferente. Já voltei a viver sem medo.
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2 comentários:
não sei se é negação, se é fra[n]queza. sei que a mim aquele braço também me sufoca.
também me desconforta.
o que me passa pela cabeça é que há quem goste de se sentir assim apertado demais. tem menos espaço de manobra para erros próprios, só dos outros.
são outros tipos de amor. ou nem isso.
:)
bolas... não tenho nada a acrescentar, Sol.
[quando dizes tanta coisa em tão poucas palavras, apetece-me chamar-te assim; polegar, embora lindo, fica um nome pequenino...]
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