terça-feira, outubro 16, 2007

as vidas interiores que saem pelas pontas das canetas

É significativo do estado em que andam os meus dias que hoje, terça, finalmente, num intervalito roubado aos preparativos das viagens que me esperam, tenha conseguido passar os olhos pelo Y. Pausa. Bom modo de esperar que mais uma máquina de roupa levante voo durante a centrifugação, ler os belos textos de Vasco Câmara sobre o DocLx. Já tinha saudades. Mas a melhor parte de ter dedicado esta meia-horita à letra impressa [loucura, meia-hora sem trabalhar, sem arrumar caixotes, sem dobrar roupa! aaaaarrrgh!] foi uma pequena pérola escondida numa relativamente banal entrevista a Paul Auster, a propósito do seu filme recém-estreado. A pergunta era: É possível que haja alguma coisa muito importante para si mas sobre a qual nunca escreva [o português da questão era mauzito, eu alindei-a, confesso...]? O elegante Auster, no seu fato de realizador cosmopolita, responde intrépido: É uma óptima pergunta. Nunca me deparei com essa situação. Mas se sentisse necessidade de escrever sobre alguma coisa escrevia. Não há nada em que eu não tocasse.


A resposta é interessante. Transborda confiança. É simplista, mas não simples. Deixa-me a pensar. Não são só os preconceitos que nos impedem de tocar em algumas coisas, coisas diferentes, embora tantas se intuam idênticas, para cada um de nós. E a necessidade de escrever ou criar ou falar sobre seja o que for, nasce de onde, até que ponto a controlamos, ou mesmo conhecemos? Até que ponto a reconhecemos nas palavras, traços ou imagens visuais ou sonoras que produzimos? Até que ponto é que, escrevendo para o nosso leitor interior, temos coragem e capacidade de não deixar pedra sobre pedra, de desenhar e encarar os produtos das mais profundas necessidades? E a um escritor de profissão, e, salvaguardadas as devidas distâncias, a um blogger que, como eu, não saiba muito bem por que tem um blog, coloca-se uma pergunta suplementar: quais dessas necessidades são publicáveis, e sob que forma?

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