Não dá para escapar, como tão bem se lê na Crónica Sem Dor do Rui Tavares. Na última página, sim, aquela por onde começo a leitura do jornal, já não pelo Calvin, mas pelo Rui, precisamente, cujas palavras tantas vezes subscrevo. Como hoje: um português dos últimos dezoito anos, que goste de ler imprensa, é filho deste jornal, mesmo que disso não se dê conta. Eu, como o Rui, sou-o, embora ainda me lembre bem da era a.P. (antes do Público), em que o Diário de Lisboa era rei lá em casa e custava sempre setenta e cinco escudos, sem quilos de suplementos oficialmente gratuitos mas que inflaccionam e fazem variar diariamente o preço do jornal. Que a Guidinha era uma moça económica. E os tempos eram outros.
Os tempos. O Público tem 18 anos. E eu continuo a embirrar com o director, apesar dele nunca me ter chamado "rasca". Na P2 comemorativa de hoje, devidamente orgulhosa, mas enxuta, cada crónica traz a idade do cronista há dezoito anos atrás. Doze, treze, dezassete, dezoito, vinte e nove, trinta e cinco - bendito Miguel Esteves Cardoso, que não haviam de ser os cinquenta a impedir-te de começar uma crónica de aniversário com uma dissertação sobre as delícias do sexo oral e os engulhos dos pêlos púb(l)icos. Treze anos tinha eu quando percebi que finalmente podia fechar o luto pelo fim do DL, que me deixara, a mim e ao meu pai, órfãos do mesmo sujeito. Comprámos o primeiro Público. E o segundo já era "o nosso jornal". Fiz catorze nesse ano, uns meses depois. E assim, de repente, tomo consciência de que já há uns tempos que leio regularmente a minha própria geração. Tempo apenas para uma paragem quase surpreendida, para reparar nesta árvore inconscientemente abraçada, e para deixar ecoar na mente uma das pequeninas jóias que enchem os diálogos da minha dose de Fassbinder de ontem:
- O tempo voa!
- ... disse o ancião, esquecendo-se de inspirar.
- Isso é triste.
- Depende de quem ouve.
quarta-feira, março 05, 2008
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3 comentários:
Quer dizer que já passei mais tempo vivo com o Público a existir do que sem ele? Porra... não tinha dado por isso... Mas também... já passei mais tempo vivo com 4 canais de televisão do que só com 2... para rapaz novo às vezes sinto-me demasiado velho...
Ah pois é, bébé... ;) Pois eu não me sinto nada velha, sinto é que tenho um passado. Um passado, ou vários. E isso diverte-me, muito.
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