Em casa
Estão duas vacas pintadas no meio da avenida. Sorrio com relativo espanto, ao vê-las... às vezes até me esqueço de que vivo no centro da cidade. Os autóctones e os turistas olham-nas, atentamente ou de relance, fotografam-nas. Um típico indígena de barriga e bigode, bufa desdenhoso, isto lá tem algum jeito, sempre olhando em redor a confirmar que a iluminada mensagem chega a alguém. Mais gente pensou como ele... numa honesta manifestação dos tempos que correm, alguém já vandalizou - em menos de 12 horas de exposição - uma das vacas expostas mais lá abaixo, nos Restauradores. Que orgulho na nossa gente, pá! Ao fundo, o pessoal junta-se em redor da renovada praça e olha, olha olha olha olha, está cheio de artistas do La Féria, pode ser que se consiga ver a Anabela, ou o Quintas, o Joel Branco, o Tó Leal, não é o papa mas é o que se arranja, olha olha olha, melhor estariam aqui as vacas, pelo meio do não-renovado jardim ainda arranjavam qualquer coisita para pastar. E o meu paradoxo-bairro tão citadino e tão sossegado, vai ter o verão chagado, já se vê, pelos roufenhos altifalantes das carrinhas de promoção do desporporcionado talho, anunciando as gloriosas corridas que aí vêm, os heróis da arena, sem os quais nem se saberia já o que é ser português. Que desperdício de edifício... Até agora só os nomes dos cafés aqui em volta [Arena, Sol ou Sombra, coisas assim...] me lembravam que vivia perto de um altar sacrificial à barbárie humana. Agora vai entrar-me pelos ouvidos o verão todo. Bonito...
Mesmo assim, ando doida por voltar para casa. E isto é que é ser português. Gostar de sofrer, não de fazer sofrer. Vejam lá se aprendem e se começam mas é a cantar melhor o fado e a espetar as bandarilhas noutro sítio qualquer, tipo...
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4 comentários:
E o que me custa não poder participar na manif do dia 18 contra essa m...?
[Posso escrever "merda"?]
Podes e deves.
Já somos dois que não podemos. Lembro-me de uma amiga comum que calou há tempos um bando de notáveis (!) da nossa praça que se insurgiam contra aquelas pessoas tacanhas que querem adulterar as tradições seculares e acabar com a tourada. A nossa amiga disse imediatamente que, que ela soubesse sempre foi tradição no nosso país apanhar grandes pielas e dar porrada na mulher e que ela esperava que os senhores políuticos presentes não quisessem perpetuar essa tradição também. Vai na volta...
E já agora, as vacas da Av. de Roma (falo das da parade, claro) também já foram profanadas.
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