O puto loiro de camisola azul-celeste percorre a praça. Arma de plástico automático na mão, faca de mato sem serrilha no bolso abaixo do joelho. Escolhe os seus alvos à sorte, sem grande convicção, e ora dispara ora espreita pelo cano do seu letal brinquedo. Dirige-se a mim, focando os lindos olhos de durão, o braço esticado na minha direcção, e dispara. Uma, duas, três vezes. Levo as mãos ao coração, onde ele acertou em cheio, e num último e dramático estertor caio redonda no rebordo da redonda fonte. Ele não disfarça a perplexidade face ao rigor inesperado da sua própria pontaria. Afasta-se lentamente, sempre olhando para trás para se certificar da minha dolorosa recuperação, apesar da falta de comparência dos paramédicos. Ao longo do seu caminho de caubói solitário, é interpelado pelos muitos adultos da praça que lhe conhecem o percurso dos dias. E faz mais um disparo letal, desta feita um apertado abraço ao velho sentado num dos primeiros degraus da rua obscura por onde se perde o pistoleiro.
Olha para trás uma última vez e perco de vista a camisola azul-celeste, os meus olhos de regresso à praça. Dois turistas, de ar satisfeito e bem-posto, atravessam-na com a sua vida guardada em trolleys de marca que ressaltam no basalto. Conversam animados e observam a cidade talvez nova, sem adivinharem que foi por pouco que escaparam ao terrível massacre da Praça da Batalha.
domingo, fevereiro 17, 2008
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