segunda-feira, janeiro 28, 2008

jangada

Porto, Novembro de 2007


Chega aqui, sobe mais este degrau, apoia bem a planta do pé nesta tábua. Eu faço-te o contrapeso, e a tábua balança e ondula mas fica à tona. Até que me beijes a testa no fim da viagem, o remo não se soltará da minha mão, não o largo, não te largo. Não sabemos bem onde estamos, e em parte não queremos sabê-lo, não queremos deitar a âncora, deixámo-la a pesar o seu ferro noutros mares. Temos os olhos dentro dos olhos, os olhos cerrados por pálpebras translúcidas, e a luz que as atravessa duvida da lucidez; as tábuas recusam-na e oferecem-na assim, em bandeja de prata cenografada, em gotas insignificantes que se acumulam discretamente até pesarem como âncoras nos tecidos e neles redesenharem a gravidade. Um pássaro encharcado não voa. Mas sacode-se, até que sinta o real peso das suas asas. Gosto de te ver voar. E tremo só de pensar em ferir-te, em arrancar-te uma pena que seja.

2 comentários:

K. disse...

Estas palavras... foi por me habituar à beleza das tuas palavras, à maneira como elas me fazem sentir, que escrevi uma vez um texto para ti, num telhado de Barcelona, num ocaso de Verao. :)

Manel disse...

:)