sábado, julho 07, 2007

"A música começa onde o egoísmo pára" [R.Abou-Khalil]

ou
O árabe fado globalizado


Num estrado muito simplesmente centrado, frente a um ciclorama ou a uma instalação de projectores, um oud libanês, uma bateria norte-americana, um tuba francesa, um acordeão italiano, duas vozes portuguesas. E a casa da Mariquinhas reconstruída com este bizarro adobe revestido a azulejo. Assim se desfiou uma noite de música complexa e orgânica, em que se abrem portas e mais portas sem se derrubar paredes - para usar a certeira imagem do próprio compositor. Um noite de encanto e terra e pedras da calçada.

Ricardo Ribeiro, fadista de definição, músico de generosidade, passeia o seu vozeirão por regiões inexploradas, sussurra e arranca com alma e humor. Um cantor enorme, que me comove e surpreende a cada encontro, que transborda segurança e risco, inteligência e felicidade. Tânia Oleiro, mais jovem e mais verde, menos à vontade com a linguagem, mas com uma voz belíssima e um grande coração fadista pespegado nela. Tenho a sensação de que foi literalmente atirada aos leões, mas não perdeu nem um dedo no embate. Três belíssimos instrumentistas. E o verdadeiro marco pólo que é Rabih Abou-Khalil, alaudista brilhante que toca e compõe como vive e fala, que com a sua música, que não é tradicional nem oriental nem ocidental nem jazz nem nada e tudo, alaga as palavras lisboetas de Jacinto Lucas Pires e de Silva Tavares. Em Lisboa, lamento, já era - ontem foi a última noite no São Luiz. Mas os felizardos que estiverem no Porto no próximo fim-de-semana podem entrar na viagem através da porta do Teatro Nacional de São João. Sim, a turbina que faz girar estas águas chama-se, novamente, Ricardo Pais. E apetece perguntar, pois claro, quem mais?

E porque o Rivoli continua ali, a quem se pergunta "para que serve um teatro municipal?" eu responderei muito simplesmente que serve, por exemplo, para isto.


Rabih Abou-Khalil Group com Ricardo Ribeiro e Tânia Oleiro
música: Rabih Abou-Khalil
letras: Jacinto Lucas Pires
Rabih Abou-Khalil oud Jarrod Cagwin percussão Luciano Biondini acordeão Michel Godard baixo eléctrico; tuba; serpentão
13 e 14 de Julho Teatro Nacional de São João
sexta e sábado às 21h30
co-produção São Luiz Teatro Municipal, Festival de Almada, TNSJ



imagem retirada daqui

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