O humor
Este post do Max lembrou-me uma deliciosa alegoria que um saudoso colega da FCG gostava de contar. Já desde o estaladão radiofónico do senhor Acílio, padre da ICAR, me apercebi de que o acompanhamento de menores em risco da responsabilidade da santa madre multinacional me dá logo para a anedota, para o disparate, para a caricatura... não me levem a mal, pois só deste modo consigo evitar que me dê para o bombismo militante. O humor é o desespero bem educado, escreveu Boris Vian. E as duas funcionárias das Oficinas de São José, sacanas das intrometidas que acham que podem meter o bedelho numa instituição de funcionamento comprovadamente exemplar [Gi, Gisberta, tareia, fosso, homicídio, brincadeira de mau gosto, hã?], bem que precisam de rir. E então cá vai:
Um temerário passarinho recém-nascido, deixado por momentos sozinho no ninho, decide lançar-se no espaço e voar. Naturalmente, não consegue, e estatela-se no chão. Meio zonzo, apercebe-se que não conseguirá regressar ao ninho por si só e começa a tiritar de frio. Um cão que ali passava resolve ajudá-lo: pega no passarito e acomoda-o numa quente e fofa bosta que uma vaca deixara ali perto. Contente com o conforto tão generosamente providenciado pelo amigo canino, o passarito chilreia de contente. E canta e canta e canta do seu poiso quentinho. Atraído pelo jovem chilrear, aproxima-se um gato - naturalmente, o mau da fita -, saca da bosta o passarito e devora-o, não sem antes o sacudir um bocadinho, já se sabe que os gatos são animais de um asseio irrepreensível.
Moral da história:
-Nem sempre quem te deixa na merda te quer mal;
-Nem sempre quem te tira da merda te quer bem;
-E sobretudo, quando estiveres na merda está muito caladinho.
quarta-feira, agosto 30, 2006
Bluesy South American Way
O Miguel postou esta beleza de foto, a propósito do que chama "a moda de tango". Relembra o Miguel que o tango começou por ser dançado por homens. A hegemonia peniana de que tanto fala a Sara Cacao - que impedia [ia?] tantos comportamentos e liberdades às mulheres - ou a sexualidade reprimida que acompanha o ser humano desde há tanto e desde há tanto encontra desculpas para se exprimir, as razões misturam-se. A versão oficial é, obviamente, a primeira, a segunda uma intuição inescapável. Mas um dos grandes erros actuais - ou não, se esta moda tango de que fala o Miguel for como a moda salsa, que erros pode haver?; se se transforma uma música histórica e de fortíssimo carácter em som de elevador para os salões, há-de passar a moda e o tango regressa às quase clandestinas milongas que há mais de uma década se zapam por este fadista cantinho que tanto se identifica com o choro das Pampas - um dos grandes erros é reduzir o tango a uma música erótica, de jogo de poder entre dois parceiros, quando na realidade estamos perante a expressão do exílio e de um "mal de vivre" que se comprova não ser exclusivo das classes mais abastadas - La vida es una herida absurda, canta-se em La ultima curda, a bebedeira final. Entre homens, mulheres ou misto, o tango é uma das músicas mais populares e tristes do mundo, dorida da perda, emigrada, sangrada. Tudo sexo, apenas porque tudo vida, tocada, dançada e cantada das entranhas. No princípio não se cantava ou tocava bandoneón [Borges abominava o instrumento, aliás], no princípio era o sentimento de exílio e bebedeira das mais variadas comunidades imigrantes das duas margens do Río de La Plata - e isto também convém que se lembre -, no príncipio era o desenraizamento de comunidades de culturas hegemonicamente masculinas. Depois do francês Gardel vieram os mitos das Milonguitas e das Malenas, as mulheres que cantavam nos bordéis e tinham pena do bandoneón - a mulher ainda prisioneira ou puta -, veio a Rinaldi, veio Piazzolla, Ferrer e a sua María. Vieram os tangos proibidos pelas ditaduras. E Gardel, ainda hoje comentam os porteños, canta cada dia melhor.
As mais estranhas e belas flores nascem de terras revolvidas. E há muito que convém lembrar enquanto se enrosca a perna n@ parceir@ de milonga.
O Miguel postou esta beleza de foto, a propósito do que chama "a moda de tango". Relembra o Miguel que o tango começou por ser dançado por homens. A hegemonia peniana de que tanto fala a Sara Cacao - que impedia [ia?] tantos comportamentos e liberdades às mulheres - ou a sexualidade reprimida que acompanha o ser humano desde há tanto e desde há tanto encontra desculpas para se exprimir, as razões misturam-se. A versão oficial é, obviamente, a primeira, a segunda uma intuição inescapável. Mas um dos grandes erros actuais - ou não, se esta moda tango de que fala o Miguel for como a moda salsa, que erros pode haver?; se se transforma uma música histórica e de fortíssimo carácter em som de elevador para os salões, há-de passar a moda e o tango regressa às quase clandestinas milongas que há mais de uma década se zapam por este fadista cantinho que tanto se identifica com o choro das Pampas - um dos grandes erros é reduzir o tango a uma música erótica, de jogo de poder entre dois parceiros, quando na realidade estamos perante a expressão do exílio e de um "mal de vivre" que se comprova não ser exclusivo das classes mais abastadas - La vida es una herida absurda, canta-se em La ultima curda, a bebedeira final. Entre homens, mulheres ou misto, o tango é uma das músicas mais populares e tristes do mundo, dorida da perda, emigrada, sangrada. Tudo sexo, apenas porque tudo vida, tocada, dançada e cantada das entranhas. No princípio não se cantava ou tocava bandoneón [Borges abominava o instrumento, aliás], no princípio era o sentimento de exílio e bebedeira das mais variadas comunidades imigrantes das duas margens do Río de La Plata - e isto também convém que se lembre -, no príncipio era o desenraizamento de comunidades de culturas hegemonicamente masculinas. Depois do francês Gardel vieram os mitos das Milonguitas e das Malenas, as mulheres que cantavam nos bordéis e tinham pena do bandoneón - a mulher ainda prisioneira ou puta -, veio a Rinaldi, veio Piazzolla, Ferrer e a sua María. Vieram os tangos proibidos pelas ditaduras. E Gardel, ainda hoje comentam os porteños, canta cada dia melhor.
As mais estranhas e belas flores nascem de terras revolvidas. E há muito que convém lembrar enquanto se enrosca a perna n@ parceir@ de milonga.
domingo, agosto 27, 2006
E dizia-me ontem a Violeta...
Amadurecer é aprender a ser uma criança melhor.
...
Que seas feliz como un neno, belesa.
Amadurecer é aprender a ser uma criança melhor.
...
Que seas feliz como un neno, belesa.
Van de Schoonheid en de Troost
Of beauty and consolation, na SIC, um pouco quando calha, a partir das três quatro cinco da manhã. Uma verdadeira pérola. Daquelas que me fazem dizer que gosto de televisão. O episódio de ontem/hoje, com o Nobel da Literatura de 1986, Wole Solyinka, foi maravilhoso. Espero que em cada padaria do país haja uma televisão ligada enquanto se amassa o pão de mistura do dia, porque aquele horário é realmente para padeiros e insomnes. Já que esta gente tem de falar, aproveitemos que fala baixinho e arrumêmo-la na madrugada, onde poucos ouvidos darão por eles. É pena. É triste.
Wole Solyinka, n.Nigéria, 1934
Há noites em que sabe bem ser morcego.
Of beauty and consolation, na SIC, um pouco quando calha, a partir das três quatro cinco da manhã. Uma verdadeira pérola. Daquelas que me fazem dizer que gosto de televisão. O episódio de ontem/hoje, com o Nobel da Literatura de 1986, Wole Solyinka, foi maravilhoso. Espero que em cada padaria do país haja uma televisão ligada enquanto se amassa o pão de mistura do dia, porque aquele horário é realmente para padeiros e insomnes. Já que esta gente tem de falar, aproveitemos que fala baixinho e arrumêmo-la na madrugada, onde poucos ouvidos darão por eles. É pena. É triste.
Wole Solyinka, n.Nigéria, 1934
Há noites em que sabe bem ser morcego.
terça-feira, agosto 22, 2006
sábado, agosto 12, 2006
sexta-feira, agosto 11, 2006
Mr Boogie-man!...
O telejornal da RTP mostra alegremente uma reportagem na qual tenta demonstrar que em qualquer drogaria de bairro se pode comprar os ingredientes para fazer uma bomba caseira para fazer explodir aviõezinhos cheios de amigos, irmãos, pais, mães de alguém. Cuidado pessoal, está aí o Papão! Qual spot teleshop, o Telejornal público mostra o catálogo, diz onde comprar e até diz o preço. O Papão, malta, o Papão! Cerca de €39, parece que é o que custa. Até o sem-abrigo ali da arcada pode fazer umas poupanças para comprar, basta-lhe para aí um ano. Caralho, não me ouvem, está aí o Papão! €39, é verdade, e se ligar já tem 20% de desconto em todos os materiais e ainda recebe como brinde um lenço igual ao daquele senhor que chegou a ser o líder de um país em projecto e com futuro e acabou os seus dias quase de volta à condição de símbolo terrorista, Yasser, parece que se chamava assim. Vai-nos comer, o Papão, vai-nos comer a todos! Quando começa a segunda parte da reportagem, em que se demostrava como pode comprar a sua bomba no senhor Manel da esquina que lhe vende os piaçabas, a imagem começa a ondular, qual alucinação psicadélica e surge o cágado Rodrigues dos Santos, com os olhos entre o consternado e o surpreso, explicando-se com dificuldades técnicas. O Papão, então, e não nos mostram o Papão? As dificuldades técnicas, providenciais, cheiram-me a chuva de telefonemas de telespectadores portugueses com um mínimo de dois neurónios activos. E o Papão? E esta reportagem abjecta da RTP cheira-me a obscurantismo, a cultura do medo, a provincianismo inconsciente [se for consciente é ainda mais grave], a alimento de xenofobia, a intoxicação mental. O Papão, o Papão pode estar em qualquer lado, aquele gajo brasileiro que a polícia matou no metro de Londres por ser um bocado mais escuro, quem garante que ele não era um dos papões, também há árabes no Brasil! Qual o objectivo informativo de tal reportagem? Talvez publicidade à fita Tesa, para vedar cada frincha como hilariante defesa da guerra química, como se viu fazer pela América fora [a parte tosca, naturalmente]; talvez um empurrãozinho nas vendas de pó de talco para os atentados postais com antraz. O Papão pode ser o carteiro, o porteiro, o calceteiro, o meu vizinho, eu, caramba, eu posso ser o Papão!
Ainda não passaram, as dificuldades técnicas. Pode ser que desta ainda nos safemos de um Patriot Act.
Bu!
O telejornal da RTP mostra alegremente uma reportagem na qual tenta demonstrar que em qualquer drogaria de bairro se pode comprar os ingredientes para fazer uma bomba caseira para fazer explodir aviõezinhos cheios de amigos, irmãos, pais, mães de alguém. Cuidado pessoal, está aí o Papão! Qual spot teleshop, o Telejornal público mostra o catálogo, diz onde comprar e até diz o preço. O Papão, malta, o Papão! Cerca de €39, parece que é o que custa. Até o sem-abrigo ali da arcada pode fazer umas poupanças para comprar, basta-lhe para aí um ano. Caralho, não me ouvem, está aí o Papão! €39, é verdade, e se ligar já tem 20% de desconto em todos os materiais e ainda recebe como brinde um lenço igual ao daquele senhor que chegou a ser o líder de um país em projecto e com futuro e acabou os seus dias quase de volta à condição de símbolo terrorista, Yasser, parece que se chamava assim. Vai-nos comer, o Papão, vai-nos comer a todos! Quando começa a segunda parte da reportagem, em que se demostrava como pode comprar a sua bomba no senhor Manel da esquina que lhe vende os piaçabas, a imagem começa a ondular, qual alucinação psicadélica e surge o cágado Rodrigues dos Santos, com os olhos entre o consternado e o surpreso, explicando-se com dificuldades técnicas. O Papão, então, e não nos mostram o Papão? As dificuldades técnicas, providenciais, cheiram-me a chuva de telefonemas de telespectadores portugueses com um mínimo de dois neurónios activos. E o Papão? E esta reportagem abjecta da RTP cheira-me a obscurantismo, a cultura do medo, a provincianismo inconsciente [se for consciente é ainda mais grave], a alimento de xenofobia, a intoxicação mental. O Papão, o Papão pode estar em qualquer lado, aquele gajo brasileiro que a polícia matou no metro de Londres por ser um bocado mais escuro, quem garante que ele não era um dos papões, também há árabes no Brasil! Qual o objectivo informativo de tal reportagem? Talvez publicidade à fita Tesa, para vedar cada frincha como hilariante defesa da guerra química, como se viu fazer pela América fora [a parte tosca, naturalmente]; talvez um empurrãozinho nas vendas de pó de talco para os atentados postais com antraz. O Papão pode ser o carteiro, o porteiro, o calceteiro, o meu vizinho, eu, caramba, eu posso ser o Papão!
Ainda não passaram, as dificuldades técnicas. Pode ser que desta ainda nos safemos de um Patriot Act.
Bu!
quinta-feira, agosto 10, 2006
Arrumos na selva II
Os gatos não gostam dos aspiradores. É compreensível. Um gigante que emite um contínuo ronronar ameaçador e que se o deixarmos aproximar nos suga ferozmente o pelo não é propriamente uma companhia agradável, sobretudo se recordarmos a mania chata do bicho em questão, a de vir transtornar o sono felino nos cantos mais privados da casa, com os seus meigos coices e a sua barulheira ensurdecedora. Ora, as cenas variam. Desde a fuga imediata em jeito de pantera, ao soprar e inchar para ficar do dobro do tamanho - coisa que, incompreensivelmente, dificilmente assusta o impertinente bicharoco.
O meu Sombra, habituado que está a que gatos diferentes de personalidades absolutamente díspares passem pela casa, o chateiem ou divirtam durante uns tempos e depois desapareçam como apareceram, já estabeleceu alguma proximidade com o aspirador. Não serão amigos, mas também não são propriamente antagonistas. Mas hoje, com este calor, o bicho foi deveras insuportável e inoportuno, perseguiu-o sem tréguas por cada canto mais frescote. O Sombra passou-se. Quando o bicho estava adormecido, de boca aberta, atacou-lhe a manápula insolente. De garras recolhidas, donde se pode dizer que o aspirador levou um belo par de galhetas. Mesmo assim, só acordou um bom bocado depois.
Isto preocupa-me. É que atacar alguém durante o sono não é coisa que se coadune com a nossa filosofia. Estou a ver que tenho de proibir o Sombra de sair para os telhados... não, já sei. Sombra Gomes, estás a partir de hoje proibido de ver televisão.
Os gatos não gostam dos aspiradores. É compreensível. Um gigante que emite um contínuo ronronar ameaçador e que se o deixarmos aproximar nos suga ferozmente o pelo não é propriamente uma companhia agradável, sobretudo se recordarmos a mania chata do bicho em questão, a de vir transtornar o sono felino nos cantos mais privados da casa, com os seus meigos coices e a sua barulheira ensurdecedora. Ora, as cenas variam. Desde a fuga imediata em jeito de pantera, ao soprar e inchar para ficar do dobro do tamanho - coisa que, incompreensivelmente, dificilmente assusta o impertinente bicharoco.
O meu Sombra, habituado que está a que gatos diferentes de personalidades absolutamente díspares passem pela casa, o chateiem ou divirtam durante uns tempos e depois desapareçam como apareceram, já estabeleceu alguma proximidade com o aspirador. Não serão amigos, mas também não são propriamente antagonistas. Mas hoje, com este calor, o bicho foi deveras insuportável e inoportuno, perseguiu-o sem tréguas por cada canto mais frescote. O Sombra passou-se. Quando o bicho estava adormecido, de boca aberta, atacou-lhe a manápula insolente. De garras recolhidas, donde se pode dizer que o aspirador levou um belo par de galhetas. Mesmo assim, só acordou um bom bocado depois.
Isto preocupa-me. É que atacar alguém durante o sono não é coisa que se coadune com a nossa filosofia. Estou a ver que tenho de proibir o Sombra de sair para os telhados... não, já sei. Sombra Gomes, estás a partir de hoje proibido de ver televisão.
Arrumos na selva I
-Vive ali uma aranha relativamente grande... O que é que faço, mato-a? Ou deixo-a estar?
-Eh pá, é esquisito deixá-la estar, mas matá-la?... Não dá para a atirar pela janela, lá para trás para o jardim?
-Feito!
Bem... sempre é melhor ser despejada em vôo que assassinada na sua própria casa.
-Vive ali uma aranha relativamente grande... O que é que faço, mato-a? Ou deixo-a estar?
-Eh pá, é esquisito deixá-la estar, mas matá-la?... Não dá para a atirar pela janela, lá para trás para o jardim?
-Feito!
Bem... sempre é melhor ser despejada em vôo que assassinada na sua própria casa.
Chama-me nomes...
«A lésbica portuguesa parece ainda ter-se precipitado ao decidir adquirir a nacionalidade espanhola para poder casar. Mesmo que Portugal recusasse passar o certificado, tal não constituiria um impeditivo em Espanha. Num casamento formulado por um cidadão espanhol e um português, este certificado pode ser substituído por "uma declaração ajuramentada e solene do interessado".»
Esta é apenas uma das vezes em que nesta notícia se repete esta referência à mulher portuguesa que foi arbitrariamente impedida pelo consulado português de casar em Espanha. Não "a mulher", não "a portuguesa", não "a cidadã". A lésbica. Porque a lésbica isto, a lésbica aquilo. E além de lésbica é estúpida, porque se fosse uma portuguesa que se prezasse nem lhe teria passado pela cabeça fazer tudo legalmente, bastava um enganozito aqui, um logro acolá. Que lésbica sem patriotismo nenhum, caraças!
...
Pelo menos tem portão de saída, este aterro...
«A lésbica portuguesa parece ainda ter-se precipitado ao decidir adquirir a nacionalidade espanhola para poder casar. Mesmo que Portugal recusasse passar o certificado, tal não constituiria um impeditivo em Espanha. Num casamento formulado por um cidadão espanhol e um português, este certificado pode ser substituído por "uma declaração ajuramentada e solene do interessado".»
Esta é apenas uma das vezes em que nesta notícia se repete esta referência à mulher portuguesa que foi arbitrariamente impedida pelo consulado português de casar em Espanha. Não "a mulher", não "a portuguesa", não "a cidadã". A lésbica. Porque a lésbica isto, a lésbica aquilo. E além de lésbica é estúpida, porque se fosse uma portuguesa que se prezasse nem lhe teria passado pela cabeça fazer tudo legalmente, bastava um enganozito aqui, um logro acolá. Que lésbica sem patriotismo nenhum, caraças!
...
Pelo menos tem portão de saída, este aterro...
segunda-feira, agosto 07, 2006
Ide em paz, e que o senhor vos acompanhe as investigações no bairro.
-Boa tarrrrde, sou o elder *?+'# e este é o elder "#$%&, podemos entrar para conversar consigo um bocadinho?
-Entrar? [cof cof misturado com riso] Não vale a pena [a ler, "Não querias mai nada!..."], vai perder o seu tempo.
-Tem a certeza? É uma pessoa religiosa?
-Sim e sou, mas sou ateia.
-E posso perguntar em que é que acredita?
-Sim, mas isso demorava muito tempo a explicar e eu teria de vos convidar a entrar, o que não estava nada nos meus planos. [sai gato disparado corredor fora, saio eu atrás para o ir buscar] Olhe, acredito no meu gato, que está vivo, acredito em mim, acredito em si... e já não me parece que seja pouco.
-Já agora posso perguntar-lhe se vive nesta casa com a sua família?
-Sim sim, vivo eu e os meus seis maridos. Boa tarde.
-Boa tarrrrde, sou o elder *?+'# e este é o elder "#$%&, podemos entrar para conversar consigo um bocadinho?
-Entrar? [cof cof misturado com riso] Não vale a pena [a ler, "Não querias mai nada!..."], vai perder o seu tempo.
-Tem a certeza? É uma pessoa religiosa?
-Sim e sou, mas sou ateia.
-E posso perguntar em que é que acredita?
-Sim, mas isso demorava muito tempo a explicar e eu teria de vos convidar a entrar, o que não estava nada nos meus planos. [sai gato disparado corredor fora, saio eu atrás para o ir buscar] Olhe, acredito no meu gato, que está vivo, acredito em mim, acredito em si... e já não me parece que seja pouco.
-Já agora posso perguntar-lhe se vive nesta casa com a sua família?
-Sim sim, vivo eu e os meus seis maridos. Boa tarde.
quinta-feira, agosto 03, 2006
Onde está você agora? [É que eu só em pontas consigo ver seu cocuruto]
Caetano foi brilhante, ontem à noite na praça do CCB. É o mínimo que se pode dizer de alguém que com o violão e a voz fez música serena e entregue, curtiu, improvisou, até um pezinho de samba se soltou em Não enche, sem percussão, mas sempre agitando o sangue. Violão e voz. E toda uma história de grandes canções que está nas gargantas e nos pés de quem assiste. Com o repertório com que nos tem enchido os dias durante as últimas décadas, Caetano poderia fazer vinte noites como a de ontem, sem nunca repetir uma canção, e mesmo assim sobrava história para os nossos ouvidos. Por isso um concerto destes, violão e voz, sem álbum para promover, é uma deliciosa incógnita. Por isso, cada canção é um presente que não sabemos que vamos receber, embrulhado na voz de veludo elástico e nos dedos malandros, que arreliam e apaziguam o violão. Leãozinho, Você é linda, Trilhos urbanos [“pena de pavão de krishna, maravilha, vixe maria mãe de deus, será que esses olhos são os meus?”] , Coração Vagabundo, Desde que o samba é samba, Sampa [“é que narciso acha feio o que não é espelho”], um fantástico Qualquer coisa e todos ficámos para lá de Marraquexe, a maravilha porteña que é Volver, o ecuménico Terra [“quando eu estava preso na cela de uma cadeia é que eu vi pela primeira vez as tais fotografias em que apareces inteira, porém lá não estavas nua e sim coberta de nuvens...”], o forró da Luz de Tieta sem que o público tenha, como é tradição, começado a gritar “Eeeeta, eta eta eta!!!!!” fora de sítio. E no entanto...
No entanto, um concerto não é um disco ao vivo. Uma plateia infindável de cadeiras ao preço do ouro, um palco baixo, colunas de som apenas à frente, e os plebeus que ficaram em pé, cá atrás, arrotando 20 euros por um bilhete que lhes permitiu apenas ver cabeças e costas – vá lá, entre um pescoço e uma cabeleira loira lá consegui descortinar que o homem estava mesmo no palco – e ouvir mal e às vezes nada do que Caetano disse no único momento em que falou com o público. Não tenho outras palavras para o que o CCB montou na sua praça central ontem à noite: um logro, um roubo, uma falta de respeito por público pagante. No final de uma noite em que um grande músico nos ofereceu o que de mais íntimo sabe fazer, só me apetecia cantar bem alto aos ouvidos da direcção do CCB uma canção de outro repertório: “Quero o meu dinheiro de volta! Tanta gente a dar-me a volta, não foi p’ra isto que eu vim cá. Quero o meu dinheiro de volta, não é tarde nem é cedo, quero o meu dinheiro já!”
Mas Caetano continua lindo, mais que demais, num glorioso e sereno envelhecimento.
Caetano foi brilhante, ontem à noite na praça do CCB. É o mínimo que se pode dizer de alguém que com o violão e a voz fez música serena e entregue, curtiu, improvisou, até um pezinho de samba se soltou em Não enche, sem percussão, mas sempre agitando o sangue. Violão e voz. E toda uma história de grandes canções que está nas gargantas e nos pés de quem assiste. Com o repertório com que nos tem enchido os dias durante as últimas décadas, Caetano poderia fazer vinte noites como a de ontem, sem nunca repetir uma canção, e mesmo assim sobrava história para os nossos ouvidos. Por isso um concerto destes, violão e voz, sem álbum para promover, é uma deliciosa incógnita. Por isso, cada canção é um presente que não sabemos que vamos receber, embrulhado na voz de veludo elástico e nos dedos malandros, que arreliam e apaziguam o violão. Leãozinho, Você é linda, Trilhos urbanos [“pena de pavão de krishna, maravilha, vixe maria mãe de deus, será que esses olhos são os meus?”] , Coração Vagabundo, Desde que o samba é samba, Sampa [“é que narciso acha feio o que não é espelho”], um fantástico Qualquer coisa e todos ficámos para lá de Marraquexe, a maravilha porteña que é Volver, o ecuménico Terra [“quando eu estava preso na cela de uma cadeia é que eu vi pela primeira vez as tais fotografias em que apareces inteira, porém lá não estavas nua e sim coberta de nuvens...”], o forró da Luz de Tieta sem que o público tenha, como é tradição, começado a gritar “Eeeeta, eta eta eta!!!!!” fora de sítio. E no entanto...
No entanto, um concerto não é um disco ao vivo. Uma plateia infindável de cadeiras ao preço do ouro, um palco baixo, colunas de som apenas à frente, e os plebeus que ficaram em pé, cá atrás, arrotando 20 euros por um bilhete que lhes permitiu apenas ver cabeças e costas – vá lá, entre um pescoço e uma cabeleira loira lá consegui descortinar que o homem estava mesmo no palco – e ouvir mal e às vezes nada do que Caetano disse no único momento em que falou com o público. Não tenho outras palavras para o que o CCB montou na sua praça central ontem à noite: um logro, um roubo, uma falta de respeito por público pagante. No final de uma noite em que um grande músico nos ofereceu o que de mais íntimo sabe fazer, só me apetecia cantar bem alto aos ouvidos da direcção do CCB uma canção de outro repertório: “Quero o meu dinheiro de volta! Tanta gente a dar-me a volta, não foi p’ra isto que eu vim cá. Quero o meu dinheiro de volta, não é tarde nem é cedo, quero o meu dinheiro já!”
Mas Caetano continua lindo, mais que demais, num glorioso e sereno envelhecimento.
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